Não sei quantos profissionais podem dizer que fizeram de seu local de trabalho um laboratório permanente. Eu posso – e por exatos 28 anos. Ou seja, desde que entrei neste jornal.
Por causa dessa liberdade de experimentação, termina hoje minha colaboração com aFolha.
Eu provavelmente teria um caminho garantido e previsível na Redação, carregando no currículo os principais prêmios de jornalismo, reportagens investigativas de impacto mundial e uma coluna que está, há décadas, entre as mais lidas.
Mas aFolha(e aqui personalizo na figura de Otavio Frias Filho) sempre me estimulou a ousar, trocando o seguro pelo incerto, cultivando meu vício irrecuperável pela adrenalina do inusitado.
Nesse ambiente experimental, pude desenvolver projetos independentes. Um deles, o Catraca Livre, foi apontado, neste mês, em Londres, por um júri da Universidade de Oxford, BBC e “Financial Times” uma das mais importantes inovações digitais de impacto social. No início do ano, virou estudo de caso na Escola de Negócios de Harvard.
Apenas meu mérito? Seria uma injustiça e uma desonestidade intelectual se não admitisse que, sem o apoio daFolha, dificilmente teria obtido esse tipo de reconhecimento.
O prazer da inovação que me liga tão profundamente àFolhafez, paradoxalmente, com que eu fosse me afastando, seguindo caminhos diferentes. Assumi projetos independentes de comunicação focados em jornalismo comunitário e educativo -no início do próximo ano lanço uma plataforma digital focada na descoberta de gente que pensa fora dos padrões convencionais.
Esses projetos foram, com o tempo, gerando mais áreas distintas de interesses do que complementaridades com o jornal.
Saio daFolhacom a gratidão de quem teve suporte para fazer da vida um laboratório.
Mas aFolhanão sai de mim: estará sempre associada à sensação de que o exercício da imaginação é o que nos torna singulares e relevantes.